Como curar um fanático
Israel e Palestina: entre o certo e o certo
Amós OZ
Tradução Paulo Geiger | Companhia das Letras, 2016
Em meio ao cenário atual, onde a polarização é cada vez maior, faz-se necessário discutir sobre a tolerância, para tentarmos combater o fanatismo com antídotos como aqueles propostos por Amós Oz em seu livro “Como curar um fanático”.
Amós Oz foi um escritor com vasta produção literária, que cresceu em Jerusalém, onde vivenciou o conflito Israelo-Palestino. De sua posição próxima ao conflito, chegando a se declarar “um especialista em fanatismo comparado”, o autor fala com propriedade sobre os males por ele causados.
Na obra em exame, Oz destaca que a disputa entre Israel e Palestina é uma disputa entre dois lados que estão certos, pois ambos foram vítimas da Europa. Para ele, o amor sozinho não é capaz de resolver este conflito, sendo necessário o compromisso entre os Estados e sua disposição para fazer concessões e sacrifícios. Acrescenta que o fanatismo é um “gene mau da natureza humana”, e que por isto devemos ser prudentes para não nos transformarmos em fanáticos ao tentar combatê-lo. Aponta que, muitas vezes, o fanatismo começa em casa “com o impulso comum de mudar um parente para o próprio bem dele”, e avalia que este impulso faz do fanático um grande altruísta, alguém que está mais preocupado com a vida alheia do que com a própria vida. Como explicação para o que chamou de altruísmo, Oz afirma que o fanático tem pouco ou nada de si para se ocupar.
O livro também apresenta outros aspectos que tornam possível identificar um fanático, sendo:
- a intolerância: “O fanático só sabe contar até um; dois é uma cifra grande demais para ele ou ela”;
- o sentimentalismo: em detrimento da razão, o culto a personalidades (líderes políticos, religiosos, indivíduos carismáticos); e
- a falta de senso de humor.
Pois bem, uma vez identificado um fanático, como então combatê-lo? Oz nos dá algumas diretrizes como resposta a esta questão. Defende ser possível combater o fanatismo:
- através da imaginação: “imaginar outras vidas, outras salas de estar, outros amores e outros pesadelos pode nos fazer sair de nossa sala de estar e ir ao encontro da outra pessoa a meio caminho da ponte”;
- através da boa literatura: “Todo extremismo (…) toda forma de fanatismo em Shakespeare termina ou numa tragédia ou numa comédia. O fanático nunca fica feliz ou está mais satisfeito no final; ou está morto ou vira uma piada”; e
- através do senso de humor – segundo ele a grande cura: “Humor é relativismo, (…) humor é a capacidade de perceber que, não importa quão justo você é, e como as pessoas têm sido terrivelmente erradas em relação a você, há um aspecto da vida que é sempre um pouco engraçado”.
Conclui afirmando que, assim como a sua origem, a cura também pode ser encontrada em casa: “virtualmente na ponta dos dedos” e na capacidade de reconhecer a competência peninsular de cada pessoa:
“nenhum homem é uma ilha (…) mas, cada um de nós é uma península, metade ligada ao continente, metade voltada ao mar; metade ligada à família e amigos e cultura e tradições e país e nação e sexo e língua e muitos outros laços. E a outra metade quer ser deixada só e ficar voltada para o oceano (…) a condição de península é a própria condição humana”.
Com uma boa dose de imaginação, exercitando nossa capacidade de nos colocarmos no lugar do outro, recorrendo à boa literatura, com senso de humor e habilidade para reconhecer a característica peninsular de cada um, podemos, ao menos, ter “uma defesa parcial contra o gene do fanatismo que existe em todos nós”.