Muitas são as razões para se estudar Santo Agostinho. Ele escreveu muito, sobre muita coisa e é citado, discutido, refutado, e até distorcido há muitos anos. Sua obra influencia religiosos (católicos e protestantes) e ateus, filósofos e teólogos, e intelectuais de toda espécie. Diante disso, é melhor estudá-lo. Deus me livre do “pecado” de falar com tamanha profundidade de um autor de que estou me aproximando! Minha inquietude, muito próxima daquela inquietação presente no coração das filósofas, me levou à pergunta: Por que não estudá-lo?
O Labô (Laboratório de Política, Comportamento e Mídia da PUC-SP) trouxe esta oportunidade por meio do Núcleo de Estudos Agostinianos. Trata-se de um Estudo dirigido de Agostinho. Um luxo irresistível. Por onde começaria sem direção?
Já era do meu conhecimento que o homem Agostinho era polêmico e tinha grande apetite para uma boa discussão. O orientador advertiu: “para entender Agostinho, ajuda muito saber quando ele escreveu, mas, principalmente, com quem ele estava falando”. Sou-lhe grata por isso.
A pesquisa foi, então, iniciada com o texto A Predestinação dos Santos. Longe de mim indagar o porquê da escolha deste texto, mas, monologando, me perguntei por que esse texto que foi escrito no final da vida de Agostinho? Afinal de contas, a gente ouve tanto falar nos best sellers Confissões e Cidade de Deus…
Após a leitura, acho que entendi o motivo: o texto cobre o pensamento Agostiniano sobre o tema da Graça, desde o pecado original até a salvação. Fala da graça, do início da fé, da perseverança, da justiça e misericórdia divinas, além de dar muitas pistas do que ainda está por vir nas inúmeras discussões presentes na obra do filósofo. No entanto, cuidado, a noção de “predestinação” pode causar um certo mal-estar no leitor moderno: a salvação não é para todos. É para todos aqueles que Deus quis salvar. Agostinho afirma que recebeu esses ensinamentos de Paulo de Tarso, e assim respalda a sua tese nas Escrituras. Estarei entre as eleitas? Como dormir com este barulho? Devo buscar conforto em um dos milhares de autores que o refutam? Este sentimento de espanto e admiração não deixam de ser um afeto transformador que o filósofo provoca em seu leitor.
Mas e o Livre-Arbítrio? Como conciliar graça e livre arbítrio? Muitos tentaram e, pelo que vejo, outros tantos seguem tentando até hoje. A graça não é dada por merecimento? Como manter então a massa motivada, esforçando-se para realizar uma boa ação e receber em troca a luz sagrada da graça? Qual é, afinal de contas, o papel do homem e sua contribuição para a salvação? Por que as leis foram reveladas? Adianta cumprí-las? E Jesus, é o predestinado por excelência, por meio do qual Deus predestina quem Ele quer? Meu Jesus!
O orientador também adverte que, ao estudar Agostinho, deve-se combater a ansiedade e reservar espaço para estudar as opiniões manifestamente contrárias a ele. Maniqueus, Pelagianos, Semi-Pelagianos…
Indo por partes, aprendemos que Agostinho chegou à conclusão de que o mal não existe em si, o mal nada mais é do que a ausência de Deus, o distanciamento do Sumo Bem. Pelagianos foram considerados heréticos por colocarem o homem no centro do processo salvífico: a criatura seria causa da salvação ao defenderem que toda boa obra seria fruto exclusivo do livre-arbítrio forte, sem nenhuma mácula, pronto para escolher entre o bem e o mal, assim como Adão no Paraíso. Os semi-pelagianos, por sua vez, não tiveram melhor sorte ao atribuir ao homem o primeiro passo da fé (e, consequentemente, da salvação), induzindo-nos a pensar que o homem e Deus teriam o mesmo peso na equação.
Para discordar de Santo Agostinho, e encontrar espaço para todos na salvação, o sujeito tem que suar. Agostinho não é para os fracos, e disso eu não sabia.
Também não sabia o quanto o estudo de Santo Agostino te captura, seduz e faz brotar uma vontade de estudar não só Agostinho, mas seus defensores, opositores e as Escrituras (!).
Meu amigo Santo Agostinho, está sendo um prazer, um privilégio e um desafio, te conhecer…