Estudos Agostinianos

Apologia do pecado

Na argumentação Agostiniana acerca da existência do mal no mundo e por conseguinte na intrínseca propensão humana ao pecado (desde a sedição de Adão e Eva diante da árvore do conhecimento) terminamos por considerar apenas a ilicitude desta que é, segundo a filosofia Cristã, a mácula inscrita no coração do homem desde a eternidade.

Entretanto, o pecado possui um valor pedagógico e soteriológico nas radículas da obra de Agostinho e somente uma leitura mais abrangente desse tópico poderá dar-nos com acuidade essa nova perspectiva.

Encaramos, num primeiro olhar demasiadamente conhecido, o pecado como o apelo invencível que as coisas do mundo têm a nos oferecer: poder, dinheiro, fama, embriaguês sensualística e quejandos. Ora diz Agostinho (especialmente no Livre Arbítrio) quanto mais nos entregamos às ilusões de tudo aquilo que é necessariamente passageiro e portanto, relativo, mutável e corruptível ou seja, quanto mais nos entregamos ao canto da Sereia advindo do mundo; quanto mais esquecemos de apoiarmos nossa existência naquele que fundamenta nossas contingentes vidas – o Deus que nos retirou do nada e nos fez sua imagem e semelhança – mais nos  desesperamos em culpa, miséria e arrependimento. Mas essa queda existencial pode ser especialmente redentora!

É que cedendo às tentações do Demônio e preferindo os prazeres imediatos e efêmero da carne (como o Fausto de Goethe) ao invés da segurança de nos abrigarmos nos mandamentos daquele que jamais transige do seu incomensurável Amor por suas criaturas, caímos e nos despedaçamos na fatalidade dos enganos humanos e acede à alma humana o terrível peso de sua inata liberdade, a nossa má intenção em não escutar os apelos daquele que nos quer verdadeiramente bem, a fonte do Sumo bem.

O pecado não apenas marca a ontologia da condição humana em suas escolhas viciadas pelo mal mas, e talvez mais importante ainda na obra de Agostinho, ele é fonte de salvação quando finalmente (e podemos contar com os Evangelhos para nos ajudar…) ouvirmos a voz do Pai dizendo ao filho: volta, deixa de comer a comida oferecida aos porcos e vem ceiar junto a mim!

Sobre o autor

Eduardo Oyakawa

Pós-doutor em Filosofia, Subjetividade, Cultura e Artes na UNIFESP, Doutor em Ciência da Religião, Linguagem e Mística Judaica pela PUC-SP, Mestre em Ciência da Religião, Filosofia da Religião pela mesma instituição. Pesquisador do Núcleo de Estudos Agostinianos do Laboratório de Política, Comportamento e Mídia da Fundação São Paulo/PUC-SP – LABÔ.