Aqueles de nós que identificam e julgam filmes ou séries históricas a partir do que entendemos como fora do contexto – o que em linguajar mais técnico, vem a ser chamado por anacronismo – estão adentrando o campo da reflexão sobre a história que recebe o nome de historiografia.
Assim, a partir deste ponto de vista, e sob a luz da história, um mesmo evento pode ser pesquisado, debatido, refletido e escrito de diferentes modos. Numa perspectiva historiográfica, incorpora-se então o relativismo e a alteridade e se leva em consideração distintos prismas e focos.
No entanto, este viés de abordagem também possibilita que tomemos conceitos como tributários de uma época ou visão de mundo, o que permitirá que se examine um ponto de partida e a própria maturação de determinadas ideias e concepções.
A obra da historiadora norte-americana, Gertrude Himmelfarb (1922) se perfaz num excelente exemplo deste tipo de proposta. Tendo sido mais recentemente publicada em nosso país (Os caminhos para a modernidade: os iluminismo francês, britânico e americano, de 2011 e A Imaginação Moral: Jane Austen e George Eliot, Burke e Stuart Mill, Disraeli e Churchill, Oakeshott e Trilling e outros grandes nomes da política e da literatura, de 2018), sua reflexão pode ser aqui tomada como uma referência no que diz respeito a uma historiografia dos conceitos.
Abordando com sofisticação e refinamento, autores, obras e concepções das mais complexas, o que nos deparamos é com um genuíno e elegante percurso dos conceitos que ela acolheu para a sua reflexão. E sua disposição historiográfica se manifesta tanto em relação a uma ideia – imaginação moral, por exemplo – que perpassa a sua leitura da obra e vida dos autores ou políticos. Ou então, de uma era que supostamente veio a compartilhar de um título unificador, mas que esconde importantes e não tão aparentes distinções, como no caso dos Iluminismos que veio a tratar. Em Himmelfarb, nos aproximamos dos conceitos como se deles nos tornássemos quase íntimos, tal é a maestria de sua poderosa narrativa.