A pergunta acima é, de longe, muito difícil de ser respondida, mas podemos fazer algumas aproximações. Do ponto de vista da pesquisa em comportamento político, a obra The Civic Culture: Political Attitudes in Five Western Democracies, Princeton: Princeton University Press, de Gabriel Almond e Sidney Verba, publicada em 1963 (com uma segunda edição revista de 1989), deve então ser recuperada. Trata-se de uma referência de estudos empíricos nesta área que também é tratada por Ciência Política. Ambos os autores dispuseram a hipótese de que as escolhas humanas – neste caso, as políticas – eram pautadas por um complexo de elementos, injunções e valores que ganham forma no caldo cultural que amadurece numa nação democrática. Este encaminhamento se manteve mais aceito até meados da década de 70, quando começa a se destacar uma teoria conhecida pelo nome de escolha racional, Rational Choice. Neste caso, como o nome deixa claro, as escolhas seriam pautadas pela razão, sendo que os defensores desta visão tomam por base as relações econômicas, ou o que acontece entre o consumidor e os produtos que ele adquire.
Mais recentemente, no início do século XXI, começou a ser retomado o conceito de cultura, mesmo que, para tanto, ele continue a se mostrar impermeável a um tratamento empírico. Enfim, como delimitar o que quer que venha a ser a cultura de um povo? Um ponto de partida, no entanto, é aquele que leva em consideração as gerações, uma vez que o comportamento geracional se encontra mais estabilizado em relação às caraterísticas que poderíamos associar a uma ou outra geração.
Ronald Inglehart e Christian Welzel, na obra Modernização, Mudança Cultural e Democracia: a Sequência do Desenvolvimento Humano, São Paulo: Editora Francis e Verbena Editora, 2009, partem do princípio de que uma geração se modifica em relação à anterior, mas que não consegue se afastar plenamente dela. Assim, observaríamos a presença de aspectos que nos chegam através de valores, preferências, juízos e entendimentos mais amplos, que seriam modificados a partir da emergência de novos problemas ou situações. A preocupação com uma alimentação dita mais saudável ou com o meio-ambiente, uma vez que são temas mais recentes, colocariam uma necessidade de posicionamento para as presentes gerações, o que não ocorreu para quem viveu nas décadas anteriores, a de 50 e 60, por exemplo. Este sendo um assunto abordado por Louek Halman, no capítulo “Political Values”, que consta do livro The Oxford Handbook of Political Behavior, Oxford: Oxford University Press, 2009, organizado por Russell J Dalton e Hans-Dieter Klingemann.
Existem aspectos cruzados que nem sempre são levados em consideração. Para oferecermos mais dados sobre isso, vamos em direção aos exemplos. A caracterização e distinção de uma geração em relação a outra não conta com uma suposta precisão. Pensamos naqueles casos em que a distância entre uma e outra não é tão clara, como é o caso dos Boomers e da Geração X. Alguns X são mais próximos dos Boomers e outros mais identificados com o contexto assimilado da pós-modernidade, vivendo então numa atmosfera mais distópica.
Além disso, situações específicas e que dizem respeito à construção de valores políticos podem influir. Pai e mãe mais próximos da direita, filhos que se orientam para a esquerda; filhos que desejam demarcar um distanciamento da cultura que seus pais representavam e que, por isso, viram na esquerda um aggiornamento, uma perspectiva de demarcação de uma posição sentida como mais avançada, moderna ou esclarecida em relação à mantida pelos pais; marcador de ambição por pertencimento a uma classe social considerada superior à sua, seja em termos financeiros ou idealizados enquanto tal; uma estetização desta posição de distanciamento a partir da assimilação de conceitos ou ideias políticas que se configuram num modo de ser, de se comportar, de se vestir, de continuamente se pronunciar como se cada opinião se tornasse um statement.
Para esse caso em especial, o percurso da subjetividade, muito difícil de ser mapeado, pode fazer com que diferentes valores políticos persistam de uma geração para outra. Um pouco disso se percebe em nosso país, na permanência de temas e situações que remontam às décadas de 60 e 70, no período da ditadura militar. As tensões experimentadas, ainda que por quem tinha pouca idade naquele contexto, podem vir a pesar em relação ao que é transmitido aos filhos. Mas é bom que se perceba, mesmo em se tratando de política, os motivos podem não ser exatamente esses. Vícios, taras e maneirismos de comportamento também devem ser postos à mesa.
Assim, nem sempre é por amor à justiça, apreço pela verdade e aderência às causas ditas sociais que uma pessoa se qualifica como ligada a um partido político ou outro. Pode ser então que muitos vetores estejam em ação, alguns dos quais não exatamente remetidos à política stricto sensu. As reflexões daqueles que pretendem sondar o comportamento político podem partir desses temas, com o objetivo de identificar estratégias que permitam a aproximação num plano mais objetivo dessas situações que, mesmo sendo envoltas na subjetividade, redundam nas escolhas, opções e atuações políticas.